A mania da equitatividade contamina os espíritos justos. É o caso das pessoas
que, não desconfiando de uma dádiva, recusam-se a aceitar uma prenda que, pelo
seu valor, não sejam capazes de retribuir. Esta atitude, apesar de ser nobre,
acaba por ser igualmente destrutiva, pois supõe que existe, ou poderá vir a
existir, uma expectativa de retribuição da parte de quem dá. Mas quem dá não dá
para ser pago. Dá para ser recebido. Não dá como quem faz um depósito ou
investimento. O valor de uma prenda não está na prenda - está na maneira como é
prendada.
Hoje em dia, com a filosofia energumenóide e pseudojusta que impera, condensada no ditado ‹‹There is no such thing as a free lunch» é praticamente impossível oferecer um almoço a alguém. Todos os gestos de amor e de amizade são reduzidos ao valor de troca, a uma mera transacção em que é tudo avaliado, registado, saldado, pago a meias e de um modo geral discutido e destruído até estar esvaziado de significado.
Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'
Hoje em dia, com a filosofia energumenóide e pseudojusta que impera, condensada no ditado ‹‹There is no such thing as a free lunch» é praticamente impossível oferecer um almoço a alguém. Todos os gestos de amor e de amizade são reduzidos ao valor de troca, a uma mera transacção em que é tudo avaliado, registado, saldado, pago a meias e de um modo geral discutido e destruído até estar esvaziado de significado.
Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'
6 comentários:
Belo texto.
Também acho...
Um beijinho e uma boa semana!
Mais uma vez, comewcei a ler e já sabia quem tinha escrito!
Subscrevo na totalidade! E acrecento que, a essencia de cada um, também se vê nas palavras que profere!
Beijinhos!
*
A verdade das relações..numa base de troca.
Eu gosto de pagar tudo fifty/fifty sei que a vida custa a todos e não gosto de me tornar um peso para ninguém.
beijinho* Somewhere boy
Susy,
A escrita do MEC é de facto inconfundível. Concordo contigo, pois as palavras são um dos meios como nos revelamos perante as pessoas.
Bom voltar a ler-te! :-)
Beijinhos*
Atenciosa,
Eu sou um pouco diferente a esse nível, apesar de no geral concordar numa certa medida. Tal como tu, também não gosto de ser um peso para alguém e também acho que a vida custa a todos, mas acho que devemos apreciar as situações caso a caso e também, consoante quem temos do "outro lado". Quando posso, gosto de oferecer algo e faço gosto nisso. Seja porque entendo que é a "cara da pessoa", seja por saber que ela vai gostar, seja porque ela não vai ter aquela oportunidade tão perto. Obviamente que nem sempre o posso fazer. Não espero algo em troca, nem quero uma compensação. Também não gosto que haja uma desproporcionalidade ou que não encontre um motivo para tal "oferta", assim como não gosto da obrigação de oferecer...
Acontece que muitas vezes, a diferença entre o que se dá e o que se recebe, não é ténue, seja na amizade, seja no amor, seja mesmo numa relação laboral e tal, pode fazer-nos pensar numa base de reciprocidade e questionar se de facto, não merecíamos um pouco mais, mas aí, não estamos a falar numa perspectiva material, mas humana, pois ninguém gosta de algo amorfo e sem reacção - queremos vida e expressão...
Beijinho*
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